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quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Decapitações no Maranhão evidenciam o caos nas penitenciárias brasileiras

Decapitações no Maranhão evidenciam o caos nas penitenciárias brasileiras

Crise vivida pelo Estado é algo frequente no sistema prisional do país

ONGs pedem intervenção federal no Estado


O Juiz Auxiliar do Conselho Nacional de Justiça em Pedrinhas. / DIVULGAÇAO TJMA (CNJ)
Um espaço construído para abrigar 1.700 pessoas comporta
 2.500. Uma área que deveria ser controlada por agentes
penitenciários é dominada por presos de facções criminosas,
que possuem telefones celulares de última geração e até
armas
. Servidores que deveriam impedir que irregularidades
 ocorressem se abstêm e, em alguns casos, são facilmente
 corrompidos. Tudo isso é o que vem acontecendo no
complexo penitenciário de Pedrinhas, o maior do Maranhão
(no Nordeste do Brasil), mas poderia muito bem ilustrar o
que ocorre na imensa maioria dos 1.478 presídios do país.

No período de um ano, 62 detentos morreram naquele Estado.
 Alguns foram esfaqueados e depois decapitados. Nesta
terça-feira, o jornalFolha de S. Paulo publicou um vídeo
 que mostra três corpos sem cabeça dentro da maior
prisão maranhense.
Nem tudo o que acontece no Maranhão hoje é uma novidade
no Brasil. O mesmo complexo penitenciário de Pedrinhas já
enfrentou uma rebelião em 2010 na qual ficou evidente a
situação. Uma inspeção do Conselho Nacional de Justiça
de 2011 fez o alerta do que poderia ocorrer no Estado.
No fim do ano passado, a Comissão Interamericana de
 Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos
 (OEA), pediu uma solução para acabar com os problemas
 de superlotação, maus tratos e insalubridade em Pedrinhas
 e no presídio central de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul,
 onde 4.591 detentos ocupam espaço destinado a 1.984
 pessoas.
Voltando alguns anos, houve ainda os casos caóticos em
ao menos outros quatro Estados. No Espírito Santo, em 2009,
ONGs constataram que presos tinham seus corpos retaliados
 e jogados em carrinhos usados para carregar roupas sujas.
São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul enfrentaram uma
série de rebeliões que resultaram em assassinatos assim
 como decapitações em 2006. Naquela ocasião, o caos se
 estendeu para as ruas com uma série de atentados contra
forças de segurança.
Expansão externa, aliás, que voltou a ocorrer em São Luís
, a capital do Maranhão, no fim de semana, quando
criminosos que receberam ordens de líderes de facções
que estão presos para que atirassem contra delegacias e
 incendiassem ônibus. As ações provocaram a morte de
 uma menina de seis anos de idade e feriram outras quatro
 pessoas.
“O que acontece no Maranhão infelizmente retrata uma
 realidade dos presídios de todos os Estados brasileiros.
Quem manda nos presídios são os presos. Os governos
 não têm políticas públicas para as penitenciárias nem
estrutura para controlar esses detentos”, afirmou o juiz
federal Walter Nunes da Silva Júnior, que por dois anos
 inspecionou presídios de 11 Estados do país enquanto
 atuava no Conselho Nacional de Justiça.
Para esse magistrado, a situação poderia ser mais caótica,
 já que em nenhuma prisão os detentos têm seus direitos
humanos respeitados. “De uma maneira geral, a maioria
dos presos até são pacíficos demais. Imagina uma pessoa
 ter que se revezar para dormir, ficar dias e dias sem tomar
 banho, sem ter direito de ver o sol, ter de dividir com outras
 300 pessoas uma cela que tem capacidade para 36 e tem
apenas um banheiro. Isso tudo é revoltante. Eles [os presos]
acabam criando códigos de conduta para poder sobreviver e,
 quando essa conduta não é respeitada, começam as brigas
 que acabam em mortes”, analisou.
Essa série de condutas, segundo especialistas, acabam por
 impulsionar a criação de facões criminosas que agem dentro
 e fora das penitenciárias. A doutora em sociologia
 Camila Nunes Dias, professora da Universidade Federal
 do ABC (UFABC) e uma das maiores estudiosas do assunto
 no Brasil, avalia que os governos estaduais abdicaram do
 controle das penitenciárias.
“Na medida em que um Estado se preocupa em prender,
 mas não em garantir o mínimo de condição de vida do
preso, ele abre mão do controle e abre o caminho para
 a formação de facções criminosas”, disse Nunes Dias.
Para essa especialista, no Maranhão, a falta de controle
 chegou a ser exacerbada, o que resultou na série de
 mortes e de irregularidades que incluem o estupro de
 mulheres e irmãs de presos além da agressão aos
doentes mentais.

Intervenção federal

Coordenadora da ONG Sociedade Maranhense de Direitos
 Humanos, Josiane Gamba diz que três fatores influenciaram
 na crise pela qual passa seu Estado: a superlotação
carcerária, a briga de facções pelo comando das prisões
 e um quadro de funcionários corruptos. “Não faltam
acusações contra esses servidores e pouco tem sido feito
 nos últimos anos”, afirmou.
Além disso, há também a falta de investimento por parte
 do governo estadual. No ano passado, a gestão da
governadora Roseana Sarney teve de abrir mão de
uma verba de aproximadamente 20 milhões de reais
oferecida pelo governo federal porque não se adequou
ao projeto que previa construir cinco novos complexos
penitenciários pelo Estado, o que ajudaria a reduzir
consideravelmente a superpopulação carcerária do Estado.
 Hoje, no Maranhão, há 5.400 detentos para 2.200 vagas.
Diante de todo esse cenário e após avaliar relatórios
 Conselho Nacional do Ministério Público e do Conselho
 Nacional de Justiça, que concluíram que o Maranhão é
 incapaz de controlar suas cadeias, três ONGs pediram
 que o governo federal faça uma intervenção no Estado.
O pedido, assinado pela Conectas Direitos Humanos,
 pela Justiça Globale pela Sociedade Maranhense de
Direitos Humanos começou a ser avaliado pelo
 procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
nesta terça-feira.
A decisão dele deve levar em conta as questões
técnicas e jurídicas, mas terá um peso político enorme.
 Isso porque a governadora Roseana Sarney é filha
 do senador José Sarney, ambos do PMDB e aliados
de primeira hora da presidenta Dilma Rousseff (PT).
A política, tão criticada pelos especialistas, está de
novo em primeiro plano.

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