Agente penitenciário conta em livro drama de rebelião na RMC
Fernanda Deslandes
Lage da PCE, em Piraquara, se transformou em vitrine para rebelados
mostrarem reféns e “força”.
O agente penitenciário José Vicente Bittencourt deveria estar de folga
O agente penitenciário José Vicente Bittencourt deveria estar de folga
no dia 6 de junho de 2001, mas preferiu deixar o descanso para outro
dia. No início do turno de trabalho, pela manhã, ele leu a escala para os
quase 40 colegas que também assumiram o plantão. Para 25 deles, foi o
anúncio de um dos episódios mais trágicos de suas vidas. Para Luciano
Aparecido Amâncio, 30 anos, foi a sentença de morte.
Um mês antes, foi transferido José Márcio Felício, o “Geléia”, apontado
Um mês antes, foi transferido José Márcio Felício, o “Geléia”, apontado
como um dos fundadores de uma facção criminosa que passou a comanda
r presídios de todo o país. Em poucos dias, ele arregimentou aproximadamente
300 “soldados” na Penitenciária Central do Estado (PCE), em Piraquara. O
grupo criou um excelente relacionamento com os funcionários da Divisão de
Segurança e Disciplina, na função também há pouco tempo.
Aparências
O início do plantão parecia tranquilo, mas, no final da tarde, José Vicente
Aparências
O início do plantão parecia tranquilo, mas, no final da tarde, José Vicente
foi cercado e recebeu ordens de um preso, para que o acompanhasse. “
Venha com a gente que a casa caiu”, disse. Começara a rebelião. Dos 26
agentes de plantão, apenas um foi atingido por golpes de estoque: Luciano
Aparecido morreu na hora.
Os outros 25 funcionários foram separados nas celas, ficaram incomunicáveis
Os outros 25 funcionários foram separados nas celas, ficaram incomunicáveis
uns com os outros e tiveram seus pertences recolhidos. Os presos queriam
ser transferidos para outros estados e iniciaram a negociação com representantes
do governo.
Nos primeiros dias, José Vicente recebeu comida, foi levado para uma cela
Nos primeiros dias, José Vicente recebeu comida, foi levado para uma cela
com celulares para conversar com a família e ficou acompanhado por quatro
colegas em um cubículo de 10 metros quadrados com televisão, onde
acompanhava pelos noticiários o que acontecia dentro da penitenciária.
Burrada
Histórias desde 1983.
José Vicente era vigiado por “soldados” da facção criminosa, alguns
Burrada
Histórias desde 1983.
José Vicente era vigiado por “soldados” da facção criminosa, alguns
portando armas brancas artesanais, outros com armas de fogo, granadas
e até bombas caseiras. A energia elétrica e o fornecimento de água, alguns
dias depois, foram cortados.
Passou o fim de semana e no quinto dia como refém, José Vicente viu o
Passou o fim de semana e no quinto dia como refém, José Vicente viu o
tratamento mudar. As negociações não chegavam a um consenso, porque
os representantes do governo descobriram o assassinato de Luciano. Os
agentes receberam seus coletes e foram levados até a laje do presídio,
para provar que todos estavam bem.
Para tentar “consertar” a morte do agente, os líderes da facção ordenaram
Para tentar “consertar” a morte do agente, os líderes da facção ordenaram
que três presos fossem executados. Dois tiveram as cabeças cortadas.
A decisão piorou a tensão dentro da penitenciária e dificultou ainda mais
as negociações.
Tensão
Os agentes começaram a receber ameaças até de abuso sexual,
Tensão
Os agentes começaram a receber ameaças até de abuso sexual,
apanharam e sofreram torturas. Deixaram de receber comida e
passaram frio. Eles foram apresentados ao Grupo de Extermínio,
composto por 25 presos, cada um responsável por matar um dos
agentes se a Polícia Militar invadisse o presídio para resgatar os funcionários.
Na manhã do dia 12, José Vicente foi escoltado para acompanhar as
Na manhã do dia 12, José Vicente foi escoltado para acompanhar as
negociações. Quatro agentes foram liberados, a negociação começou
a avançar, e mais 12 agentes voltaram para casa. José Vicente e
mais oito colegas ficaram para garantir que os presos realmente seriam transferidos.
Os 23 detentos que pediram para ir para outros estados foram transferidos,
Os 23 detentos que pediram para ir para outros estados foram transferidos,
deixando suas armas para os comparsas que permaneciam no presídio,
liderando a rebelião. Outro grupo de presos tentou arrebatar os últimos
agentes reféns, mas foi coagido pela facção criminosa.
Abraço
Depois de seis dias de desespero, os reféns foram libertados e puderam
Abraço
Depois de seis dias de desespero, os reféns foram libertados e puderam
abraçar seus familiares, que permaneceram a todo o tempo angustiados
do lado de fora do presídio, aguardando notícias. A narrativa de José
Vicente Bittencourt é do livro Penitenciária: Estágio para o inferno,
publicado no final do ano passado.
Sindicato diz que ainda há perigo
O presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Paraná,
Sindicato diz que ainda há perigo
O presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Paraná,
(Sindarspen), José Roberto Neves concorda que os agentes continuam
sofrendo os mesmos riscos demonstrados no livro de José Vicente.
“Diminuiu a disputa por território e o assassinato de presos, porque a
facção criminosa se estabelece como majoritária. Por outro lado, ela
se organiza e assume um papel que é do Estado. Se não houver
investimento no trabalhador e ele não receber estrutura adequada,
não poderá cumprir a função do Estado e evitar que a facção
criminosa o faça”, revela. O sindicato é contra a terceirização dos
serviços prestados dentro dos presídios, por acreditar que o
processo de contratação temporária não tem rigor, treinamento,
nem avaliação psicológica ou testes físicos. Os salários dos profissionais
terceirizados, segundo o presidente do Sindarspen, são mais baixos que
os dos agentes.
Polêmica
O sindicato defende que os agentes tenham porte de arma para poder se
Polêmica
O sindicato defende que os agentes tenham porte de arma para poder se
defender de ameaças nas ruas, mas que trabalhem desarmados quando
estiverem em postos de contato físico com os presos. Funcionários de
guaritas e de grupos táticos, prontos para agir antes da chegada da PM,
poderiam trabalhar armados para conter tumultos.
Registro de três décadas
A história trágica se repetiu outras vezes. Em junho de 2000, após um dia
Registro de três décadas
A história trágica se repetiu outras vezes. Em junho de 2000, após um dia
e meio de rebelião, um agente ficou paraplégico ao cair de quase 15 metros.
Em janeiro de 2010, depois de 20 horas de rebelião, o saldo foi sete preso
s assassinados, três deles carbonizados, um deles decapitado. Três dos 14
agentes que estavam de plantão foram mantidos reféns.
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Polícia pede prisão de marido incendiário em Piraquara
No livro, escrito em forma de diário, há relatórios do período entre junho
1983 e setembro de 85, a maioria sobre as mortes dentro do presídio por
disputa de território entre os presos. Também são narrados casos de
corrupção de agentes, de abusos contra os presos, de tentativas de
fuga frustradas e todas as dificuldades que passam os homens que
decidem trabalhar nessa profissão.
Arquivo
Facas e até granadas caseiras estavam com os presos.
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Negociações permaneceram tensas durante cinco dias.
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