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segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Superlotação e precariedade abrem espaço para crime organizado nas prisões

Superlotação e precariedade abrem espaço para crime organizado nas prisões

Violência praticada por facções criminosas na busca pelo poder é observada em todo o Brasil e tem ligação com excesso de detentos, sucateamento das unidades e corrupção de agentes públicos.
Centro penitenciário Presídio Central, em Porto Alegre
Quase um mês após presos registraram em vídeo os corpos de colegas mortos e decapitados dentro do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, autoridades ainda buscam respostas. Representantes de ONGs e senadores membros da Comissão de Direitos Humanos estão na capital maranhense e cobram explicações para a situação no presídio – onde já foram registradas mais de 60 mortes desde o ano passado.

A violência registrada em Pedrinhas, entretanto, não é um caso isolado. A medição de forças entre facções do crime organizado está espalhada por penitenciárias em todo o país. “As facções estão presentes em praticamente todos estados brasileiros. O que varia é o grau de organização, tamanho, extensão, e estrutura desses grupos”, explica Camila Nunes Dias, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP) e docente da Universidade Federal do ABC.
Além das organizações criminosas mais antigas e conhecidas – como o Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo e o Comando Vermelho no Rio de Janeiro – grupos locais ou ramificações regionais das facções maiores promovem atos de violência nas unidades prisionais. O encarceramento massivo é apontado por especialistas como uma das principais raízes do domínio das facções.
Para Sandra Carvalho, diretora da ONG Justiça Global, o que se vê é um “endurecimento penal” sem investimento em políticas públicas em outras áreas prioritárias. “O sistema penitenciário brasileiro não é destinado a políticas de ressocialização, é um depósito de gente”, diz.
Problema generalizado
Em Pedrinhas, assim como em outros presídios, o problema é antigo. Dias após as mortes registradas em vídeo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou relatório sobre a situação do complexo maranhense.
O texto, assinado pelo juiz Douglas Martins, coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ, cobrava a construção de presídios no interior do estado para facilitar a separação dos integrantes das facções rivais. Ele argumentou que já tinha enviado ao governo local “várias indicações” dessa necessidade anteriormente.
Facções criminosas estão presentes e em contato dentro e fora das prisões brasileiras
Em entrevista à DW concedida em outubro passado, o juiz sinalizou a situação do complexo de Pedrinhas como sendo favorável ao domínio do crime. “Não tem como funcionar porque o Estado se omite, concentra os presos, afasta o preso da família e tudo isso favorece o crime organizado”, disse então.
“O nosso modelo de sistema prisional é inadmissível. Não há muito a ser feto sem descentralizar a execução penal”, completou. Ele defende a priorização de unidades menores, e o oferecimento amplo de opções de trabalho e estudo podem ser uma solução.
Busca pelo poder
Mortes violentas como as vistas no Maranhão recentemente têm um componente simbólico forte, diz Camila Nunes Dias: “Essas formas mais extremas de violência são sintomáticas de um cenário de disputa de poder por grupos”.
Sandra Carvalho, da Justiça Global, está em São Luís acompanhando as investigações em Pedrinhas. Ela alerta para a forte presença das forças criminosas dentro e fora das prisões e acusa o poder público de inércia. “Não houve nenhum enfrentamento mais concreto por parte do governo para por término à organização dessas facções”, avalia.
Ela também aponta os agentes públicos corruptos como sendo facilitadores do crime organizado, mas defende uma discussão mais ampla sobre as formas de sanção aplicadas hoje para que a responsabilização por crimes vá além das punições.
“O mais importante é que pensemos na responsabilização para além da gama punitiva, pensar o sistema prisional não só como ampliação de vagas, mas pensar em outras formas de sanção, estruturar penas alternativas, estruturar o semiaberto, que quase não existe no Brasil”, exemplifica.
Sucateamento que gera dependência
Com cadeias superlotadas e a incapacidade do Estado de fornecer as condições adequadas de vida para os detentos, amplia-se o espaço ocupado pelo crime organizado, explica Camila Nunes Dias.
“Ao encarcerar muito mais, e sem dar condições adequadas, o Estado é o responsável principal ao dar as condições para que esses grupos tomem conta da população prisional”, detalha a pesquisadora.
Medição de forças entre facções do crime organizado está espalhada por penitenciárias do país
Ela lembra que apesar de as drogas serem a principal mercadoria oferecia por esses grupos, mercadorias lícitas (alimentos, itens de higiene, álcool, cigarros, etc.) também são usadas como instrumento para exercício do poder.
“Os presos ligados às facções que muitas vezes detêm condições econômicas melhores acabam fornecendo esse material. Isso gera relação de dependência”, continua a pesquisadora.
Muitas vezes, esse domínio extrapola os limites da penitenciária em uma tentativa, por parte das facções, de chamarem a atenção da sociedade e também demonstrarem que têm o poder.
Utilizando principalmente telefones celulares, líderes do tráfico articulam as ações nas ruas. Presos beneficiados de alguma forma dentro do presídio acabam sendo coagidos, ao saírem, a agirem em benefício da organização criminosa, como uma forma de cobrança feita pelos controladores do crime organizado.
Assaltos a bancos e carros-fortes e queima de ônibus estão entre as atividades comandadas pelas facções, como é o caso do PCC, que está presente em 90% das prisões do estado de São Paulo, segundo estimativa da pesquisadora Camila Nines Dias.

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