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sexta-feira, 14 de junho de 2019

Em reportagem da Folha, SIFUSPESP denuncia déficit de servidores penitenciários

O SIFUSPESP denunciou o déficit de servidores penitenciários no Estado de São Paulo e alertou para os impacto emocional da rotina estressante enfrentada pela categoria, ao mesmo tempo em que centenas de aprovados nos concursos públicos seguem sem nomeação.

A reportagem de página inteira - "Falta de agentes penitenciários põe segurança de prisões de SP e saúde de presos em risco" - foi publicada na Folha de S. Paulo deste 14 de junho:


Apesar do quadro difícil que enfrentamos dentro dos presídios e dos dados da reportagem sobre os déficit de trabalhadores, no final da reportagem a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) responde seu lado ao jornal como se tudo estivesse quase como um mar de rosas no sistema: afirmou que o governo Doria "vem realizando procedimentos para a contratação de funcionários", que há "dificuldade para atrair esses profissionais", e ainda negou a falta de médicos.

Como o texto completo é disponível apenas para assinantes da Folha, compartilho aqui a íntegra da reportagem feita pelo jornalista Artur Rodrigues:

"FALTA DE AGENTES PENITENCIÁRIOS PÕE SEGURANÇA DE PRIÕES DE SP E SAÚDE DE PRESOS EM RISCO 

Déficit de servidores na pasta é de 25%; ausência maior nas unidades é a de médicos

Um déficit no efetivo das prisões de São Paulo, administradas pelo governo João Doria (PSDB), coloca em risco a segurança das unidades e saúde dos detentos.

De lados opostos das grades, agentes penitenciários e presos compartilham problemas causados pelo não preenchimento de 25% nos quadros da SAP (Secretaria da Administração Penitenciária).

Agentes relatam viver uma rotina de perigo, sem funcionários suficientes manter os procedimentos de segurança indicados para lidar com os presos, em tensão constante desde a transferência de líderes do PCC (Primeiro Comando da Capital) para penitenciárias federais, em fevereiro.

Em condições insalubres, os presos muitas vezes não têm médicos para atendê-los e morrem nas celas sem assistência.

Doria foi eleito governador com a promessa de criar prisões modelo administradas pela iniciativa privada, mas sua gestão afirma que a proposta só vale para as novas unidades construídas. Enquanto isso, o sistema existente, que abriga 235 mil presos em unidades onde deveria haver 144 mil, tem sua situação continuamente agravada sem solução em vista.

De acordo com dados do governo publicados no Diário Oficial, 3.423 (35%) das 9.875 vagas de agentes de escolta —responsáveis pela segurança externa dos presídios— não estão preenchidas. Já os agentes penitenciários, que fazem o contato direto com os presos, têm 13% de vagas ociosas, ou 3.727 das 28.269 previstas.



Neste caso, o Sifupesp, um dos sindicatos da categoria, afirma que o déficit é bem maior do que o dado oficial, uma vez que os agentes acabam sendo movidos para setores burocráticos e desfalcam as carceragens.

Hoje, há nove presos por agente, quase o dobro do índice recomendado pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (cinco detentos por funcionário).

Desarmados, os agentes têm entre suas funções a de retirar presos de celas superlotadas para transferências, saídas para audiências e para atender problemas de saúde.

“Tirar um preso do pavilhão é perigoso naturalmente. Em um pavilhão onde deveria ter dois agentes, e você é o único, é pior ainda. Fica na mão dos presos”, diz um agente. Para ele e outros colegas, o que evita rebeliões e fugas é uma tática do PCC de manter relativa paz nas prisões a fim de não prejudicar seu principal negócio, o tráfico de drogas.

Isso não impede que ocorram situações como a rebelião no ano passado em Taubaté, interior do estado, iniciada após detentos agredirem e dominarem um agente.

O desgaste emocional leva muitos profissionais da área a adoecer e mesmo tentar o suicídio. “Transtorno de ansiedade, depressão, síndrome de burnout e transtorno de ansiedade são comuns. Neste ano, tivemos dois suicídios e 12 tentativas”, afirma Fábio Ferreira, presidente do Sifuspesp. Ele afirma que candidatos aprovados em concursos nos últimos anos para a categoria nunca foram nomeados.

A situação é mais grave em relação aos médicos que atuam nas prisões: apenas 92 (13%) das 726 vagas existentes estão preenchidas. O número de médicos disponíveis corresponde a pouco mais da metade do total de unidades prisionais, de 173. Também faltam enfermeiros e auxiliares de enfermagem.

“O próprio fato de pessoas ficarem encarceradas em espaço insalubre e superlotado já influencia a proliferação de doenças. A falta de profissionais de saúde traz potencialidades para doenças ou mesmo mortes no cárcere”, diz o defensor público Leonardo Biagioni, coordenador do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria.

A Defensoria tem uma série de ações civis para garantir a presença dos quadros de saúde exigido no estado, o que não é cumprido 100% por nenhuma unidade, diz Biagioni.

“Foram registrados casos de auxiliares de enfermagem e agentes penitenciários ministrando medicamentos”, diz o defensor.

Entre as ações da Defensoria, está uma relacionada à Penitenciária Masculina da Taquarituba, no interior paulista. O trabalho de apuração inclui levantamento de mais de cem presos com doenças e síndromes como Aids, tuberculose e hanseníase sem receber o devido tratamento. Entre as fotos compiladas pela Defensoria, há as de presos com feridas e a de um detento com vísceras expostas.

Na ação, é citado o caso de um homem que desmaiou e foi encaminhado à enfermaria. Auxiliares de enfermagem teriam dito que o detento estava bem e o mandaram para cela. Segundo a ação, ele foi encaminhado novamente à enfermaria e morreu.

Quando há situações de emergência, faltam motoristas e escolta para que os presos sejam levados a hospitais externos, diz o defensor Biagioni.

De 416 mortes naturais de presos, 57 ocorreram fora de hospitais, em locais como a cela e enfermaria, segundo dados obtidos pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação.

Outro lado

O governo João Doria afirma que vem realizando procedimentos para a contratação de funcionários para os quadros da SAP (Secretaria da Administração Penitenciária).

“A SAP conta com dois concursos válidos para nomeação de agentes e estão em andamento dois concursos para Agentes de Segurança Penitenciária masculino e feminino, realizados em 2017, que estão na fase de investigação social. Somente em 2019, já entraram em exercício 560 agentes”, diz nota do governo.

O comunicado afirma que o déficit de agentes de escolta estimado pela última gestão não corresponde à realidade. O governo quer diminuir as locomoções de presos investindo em teleaudiências e, por isso, o quadro atual é suficiente.

A gestão afirma também que fará um novo concurso para contratar 84 médicos neste ano, mas cita números que mostram a dificuldade para atrair esses profissionais. “No último concurso realizado, do total de 262 vagas, inscreveram-se 110 concorrentes, sendo que apenas 10 tomaram posse e 4 efetivamente entraram em exercício”, diz a nota.

A SAP nega, no entanto, que falte atendimento médico aos presos. “Sobre a assistência médica nos presídios, a correlação que o repórter faz não corresponde à realidade. Do total de mortes naturais em 2018, 19 delas foram na enfermaria das próprias unidades, onde há equipe de saúde, 12 mortes ocorreram a caminho do hospital, e 6 mortes ocorreram durante saídas temporárias, nas quais o preso está no convívio familiar, fora da unidade”.

A gestão menciona ainda parceria em 56 presídios para que municípios prestem atendimento médico aos presídios e afirma que melhorará o sistema prisional com a entrada da iniciativa privada para a criação de novas unidades.

“Das 10 novas unidades que estão em construção e serão inauguradas em 2019, quatro vão operar em gestão compartilhada, com o Estado a cargo da segurança interna e externa do presídio”, diz a nota.

CRIME USA DRONE DE MACARRÃO PARA ENVIAR DROGAS E CELULARES A PRISÕES

Arremesso de objetos por meio de aeronaves não tripuladas preocupa gestão Doria

Há 17 anos trabalhando como agente nas muralhas das prisões paulistas, João (nome fictício), 38, teve que se acostumar a vigiar o céu.

Acostumado a mirar sua arma para evitar fugas, resgates de presos e tentativa de contrabandear produtos para a unidade agora também tem de ficar de olho nos drones, a nova onda entre bandidos que buscam enviar drogas e celulares para a prisão.

O crime também usa pipas, pombos e comida para tentar furar o bloqueio nos presídios. Uma vez dentro da prisão, um celular, por exemplo, pode valer cerca de R$ 20 mil no feirão que acontece dentro dos muros.

Os altos valores estimulam a corrupção de funcionários, mas a falta de mão de obra para fiscalização também é um trunfo na mão dos criminosos —a Secretaria da Administração Penitenciária tem um déficit de 25% nos seus quadros permanentes.

Os drones, especificamente, têm preocupado o governo de João Doria (PSDB), que começou a instalar telas nas unidades e busca tecnologia no exterior para coibir a prática. Hoje, nos casos em que os agentes verificam a presença de um drone, o objeto é abatido no ar.

“Recentemente, o secretário [da Administração Penitenciária] Nivaldo Cesar Restivo esteve em Israel para conhecer as ferramentas lá utilizadas no combate a drones por meio de sistemas de vigilância e detecção em perímetro, incluindo novas tecnologias disponíveis em CFTV”, afirmou a gestão Doria, em nota.

Os criminosos se aproveitam do déficit de agentes, o que faz com que parte das torres das muralhas possa ficar temporariamente sem alguém a postos, relata o agente João. "Também temos que ficar mais tempo do que o ideal vigiando. A cada hora, o nível de atenção vai caindo", diz.



Em maio, a Polícia Civil prendeu 21 pessoas suspeitas de integrar uma quadrilha especializada no uso de drones para contrabando nas prisões. Cada entrega custava cerca de R$ 45 mil, com limite de até 1 kg. A operação foi batizada de Voo de Ícaro.

As máquinas voadoras não inibiram o uso de meios mais tradicionais como pipas e pombos. No ano passado, a polícia do Rio Grande do Sul prendeu um traficante que criou uma arma de ar comprimido para arremessar drogas dentro de uma prisão.

Outro canal de contrabando são as visitas, que hoje passam por um scanner corporal para entrar nas unidades. O chamado jumbo, pacote com alimentos e produtos de higiene levado pelas famílias, é uma das formas mais comuns.

Em março, uma visitante do Centro de Detenção Provisória de Guarulhos inseriu dezenas de cigarros de maconha dentro de macarrão tipo penne e tentou entrar.

Só neste ano houve apreensões de drogas em salsichas, arroz doce e forros de calcinhas e sutiãs. A mulher de um preso foi flagrada com quase mil comprimidos de estimulante sexual dentro de caquis.

Presidente do Sifuspesp (sindicado de agentes), Fábio Ferreira afirma que, após o fim das revistas corporais e o início do uso de scanners, o número de visitas nas prisões aumentou, o que dificulta a fiscalização. "O servidor começa a revistar às 7h e para só às 14h. Ficam só dois guardas para receber a comida. É cansativo. Vai chegar no final, o déficit de atenção vai aumentar", relata.

Como o uso do scanner também dificulta a entrada de volumes maiores, ficou mais difícil enviar maconha, por exemplo, para as prisões. A mudança coincide com a proliferação de apreensões de uma espécie de maconha sintética, conhecida como k4, que é borrifada em pedaços de papel, muito mais fáceis de serem escondidos".

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