Ação da PM em maio gerou onda de crimes em SP, apontam investigações
Três policiais da Rota foram presos por suspeita de execução em julho.
Três policiais da Rota foram presos por suspeita de execução em julho.
Facção criminosa divulgou carta em agosto com ordens para matar agentes.
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Investigações do Ministério Público indicam que a causa da atual onda de violência na região metropolitana de São Paulo foi desencadeada por uma operação da Rota, a tropa de elite da Polícia Militar. Em 28 de maio, policiais da Rota mataram seis suspeitos de pertencerem a uma facção que se reuniam no estacionamento de um bar na favela Tiquatira, na região da Penha, Zona Leste. Em junho, como represália, 11 policiais foram assassinados, quase o dobro do mês anterior (em todo estado, foram registrados 92 homicídios dolosos a mais).
Entre a noite de sexta (9) e a madrugada de sábado, foram sete mortes registradas e um ônibus incendiado (veja no vídeo acima e leia reportagem).
Mortos em São Paulo em 2012 | ||
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MÊS | ESTADO | CAPITAL |
Janeiro | 386 | 92 |
Fevereiro | 347 | 83 |
Março | 410 | 99 |
Abril | 393 | 106 |
Maio | 342 | 108 |
Junho | 434 | 134 |
Julho | 379 | 102 |
Agosto | 418 | 114 |
Setembro | 428 | 144 |
Fonte: Secretaria da Segurança Pública (SSP) |
Segundo a PM, naquela noite de maio os criminosos, que planejavam a libertação de um comparsa preso, foram surpreendidos pela Rota e reagiram à abordagem. Todos os seis morreram na troca de tiros. Para a facção que atua dentro e fora dos presídios paulistas, porém, a operação policial foi “covarde”.
(A tabela ao lado mostra que o número de homicídios cresceu na capital. Abaixo, números indicam alta no número de políciais assassinados.)
Uma testemunha denunciou que os policiais levaram um dos suspeitos até a Rodovia Ayrton Senna e o executaram lá. Essa denúncia levou três agentes da Rota ao Presídio Romão Gomes, que abriga PMs envolvidos em crimes.
Para promotores ouvidos pelo G1, essa ação foi o estopim para criminosos da facção, em busca de vingança, passarem a executar policiais militares. "Esse caso da ação da Rota que matou seis foi o estopim para desencadear essa onda de violência", disse o promotor Marcelo Alexandre Oliveira.
A Polícia Civil e a PM, por meio de sua Corregedoria, além da Ouvidoria das Polícias, através de denúncias anônimas, também apuram essa suspeita. Luiz Gonzaga Dantas, ouvidor das Polícias, que monitora a atividade e letalidade policial, afirma que o órgão investiga a relação entre policiais e a onda de violência. "Após aquelas mortes houve esse revide e chamamento do crime organizado. A PM também estaria revidando e fazendo ações de vingança", disse.
Policiais mortos em 2012 | |
---|---|
Janeiro | 6 |
Fevereiro | 6 |
Março | 4 |
Abril | 7 |
Maio | 6 |
Junho | 11 |
Julho | 9 |
Agosto | 7 |
Setembro | 12 |
Outubro | 12 |
Novembro | 10 |
TOTAL | 90 |
Dados dos índices de criminalidade divulgados pela Secretaria da Segurança Pública (SSP) de São Paulo mostram que houve aumento no número de homicídios dolosos no estado e na capital após a ação da Rota em 28 de maio. Junho teve 92 assassinatos a mais registrados no estado do que maio.
Na capital o acréscimo foi de 26 mortos. A partir daquele período, 43 ônibus foram atacados na cidade e na região metropolitana, sendo 38 delesincendiados. Desde então, ocorreram mais de 15 ataques a bases e carros policiais.
Dos 90 PMs mortos desde o início do ano até novembro, 62 foram assassinados depois do ocorrido na Zona Leste.
Segundo interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, a informação da execução de um suspeito revoltou a facção. Em 8 de agosto, as lideranças resolveram intensificar a resposta nas ruas contra a ação da Rota e ordenaram os assassinatos de PMs. O "salve geral", como é chamada a ordem enviada pelos criminosos, determinava a morte de dois policiais militares para cada integrante da facção que fosse morto.
As execuções passaram a ser feitas por criminosos que não conseguem pagar a mensalidade da facção. “Até nossas avós sabem: violência gera violência. Essas ações da PM que resultaram em mortes de bandidos acabaram contribuindo para que essa facção ordenasse a vingança”, disse o promotor Marcelo Alexandre Oliveira, que atua em Guarulhos, na Grande São Paulo.
Marcelo Oliveira é responsável por apurar a morte do policial militar Ismael Alves dos Santos, em 5 de setembro, por criminosos ligados à facção. Um dos executores chegou a ser morto posteriormente. Há suspeitas do envolvimento de policiais militares nesse último assassinato. “Mata de um lado há revide do outro”, comentou.
Morte de policiais: 48 execuções
De acordo com a estatística da PM, após a ação da Rota que matou seis, o mês seguinte teve um pico de assassinatos de policiais militares: foram 11 mortos em junho contra seis em maio.
De acordo com a estatística da PM, após a ação da Rota que matou seis, o mês seguinte teve um pico de assassinatos de policiais militares: foram 11 mortos em junho contra seis em maio.
Dos 90 PMs mortos de janeiro até novembro, cerca de 70 deles estavam de folga e sem farda. Do total de assassinados, 18 eram aposentados e 72 estavam na ativa. De acordo com a corporação, 48 das mortes têm características de execuções.
Em meio a esse fogo cruzado envolvendo motociclistas atirando em pessoas em pontos de tráfico de drogas e criminosos disparando em PMs de folga, famílias de ambos os lados acabaram destruídas. Um dos últimos casos a ganhar destaque na mídia foi da policial militar Marta Umbelina da Silva. Em trajes civis, ela foi executada na garagem da sua casa, na Vila Brasilândia, Zona Norte. Sua filha de 11 anos a acompanhava e presenciou a mãe ser morta.
A corporação reagiu, com aumento de efetivo e criação de operações, como a Saturação, em favelas e bairros violentos onde o crime tem influência, como Paraisópolis e Vila Brasilândia. Ao todo, 129 suspeitos de participarem de ataques contra PMs foram presos. Outros 20 foram mortos em tiroteios e mais 20 são procurados.
Motivações das mortes de PMs | |
---|---|
Execução | 48 |
Passional | 3 |
Reação a roubo | 32 |
A esclarecer | 1 |
Desentendimento | 3 |
Confronto em serviço | 3 |
Fonte: Polícia Militar |
A violência também fez com que os governos estadual e federal deixassem de lado suas diferenças (evidenciadas após atrito entre o secretário da Segurança Antonio Ferreira Pinto e o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo) e firmassem acordo para criar uma central integrada de inteligência contra o crime organizado.
Em encontro entre representantes da União e do Estado, na sede do governo paulista, foi determinada a transferência de integrantes da facção que ordenou ataques contra policiais para presídios federais e para o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD).
O primeiro preso a sentir na pele essa decisão foi Francisco Antonio Cesário da Silva, o Piauí. Acusado de ser o mandante da morte de PMs em São Paulo, ele foi levado da Penitenciária Estadual de Avaré, no interior paulista, para a Penitenciária Federal de Porto Velho, em Rondônia.
Chefe do tráfico de drogas na Favela de Paraisópolis, ele é apontado como autor de umalista com nomes de policiais marcados para morrer. No papel, apreendido pela PM, havia endereços de policiais, características físicas e locais onde frequentam.
Agentes penitenciários ouvidos pela reportagem temem que a transferência de chefes da facção para outras unidades provoque a ira dos presos. Há temor de novos ataques a agentes e rebeliões nas penitenciárias paulistas.
Estatuto
O plano da facção de atacar PMs já vinha sendo fomentado desde o final do ano passado. À época, o estatuto que norteia a ação dos integrantes da quadrilha recebeu dois novos artigos, passando de 16 para 18. O último item termina com uma frase que, meses depois, sairia do papel e ganharia as ruas: “Vida se paga com vida, e sangue se paga com sangue”.
Segundo o deputado estadual Olímpio Gomes (PDT), major da reserva da Polícia Militar, o governo já havia sido avisado dos ataques. “Em julho, tive acesso a documentos com ordens para matar PMs e os encaminhei para o sistema de inteligência das forças de segurança do Estado de São Paulo prontamente”, disse ao G1 o deputado. “Essas ordens foram determinadas depois da morte dos seis suspeitos pela Rota.”
O delegado-geral da Polícia Civil paulista, Marcos Carneiro Lima, diz que constatou a existência desses assassinatos encomendados. “Essa articulação covarde do crime organizado está querendo compensar eventuais mortes de criminosos em atitudes suspeitas pela polícia. É uma das teorias que a polícia está trabalhando, mas terá de apresentar provas.”
O plano da facção de atacar PMs já vinha sendo fomentado desde o final do ano passado. À época, o estatuto que norteia a ação dos integrantes da quadrilha recebeu dois novos artigos, passando de 16 para 18. O último item termina com uma frase que, meses depois, sairia do papel e ganharia as ruas: “Vida se paga com vida, e sangue se paga com sangue”.
Segundo o deputado estadual Olímpio Gomes (PDT), major da reserva da Polícia Militar, o governo já havia sido avisado dos ataques. “Em julho, tive acesso a documentos com ordens para matar PMs e os encaminhei para o sistema de inteligência das forças de segurança do Estado de São Paulo prontamente”, disse ao G1 o deputado. “Essas ordens foram determinadas depois da morte dos seis suspeitos pela Rota.”
O delegado-geral da Polícia Civil paulista, Marcos Carneiro Lima, diz que constatou a existência desses assassinatos encomendados. “Essa articulação covarde do crime organizado está querendo compensar eventuais mortes de criminosos em atitudes suspeitas pela polícia. É uma das teorias que a polícia está trabalhando, mas terá de apresentar provas.”
Apesar disso, somente na semana passada o governador Geraldo Alckmin (PSDB) confirmou que criminosos haviam ordenado a morte de PMs. O coronel da Polícia Militar Marcos Roberto Chaves, comandante do policiamento da capital, que participa das operações para combater a onda de violência, afirmou que a PM está desarticulando o grupo criminoso. “Independente deles [bandidos] entenderam se a morte do colega deles foi injusta, não cabe a eles praticarem outros crimes”, disse.
Uma das ferramentas usadas pelas forças de segurança para tentar inibir as ações da facção é o uso de grampos telefônicos. As interceptações estariam sendo feitas pela Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), por autorizações da Justiça e acompanhas por promotores. Em seguida, as informações do que os criminosos conversam por telefone dentro e fora das cadeias são passadas para a Polícia Civil e para a PM.
Uma das ferramentas usadas pelas forças de segurança para tentar inibir as ações da facção é o uso de grampos telefônicos. As interceptações estariam sendo feitas pela Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), por autorizações da Justiça e acompanhas por promotores. Em seguida, as informações do que os criminosos conversam por telefone dentro e fora das cadeias são passadas para a Polícia Civil e para a PM.
Luiz Gonzaga Dantas, ouvidor das Polícias, confirmou que o órgão também notou que as ordens para matar PMs começaram após a ação da Rota. “Todos policiais têm um limite e esse limite é a própria lei. Tivemos informações das investigações policiais de que essas mortes também são decorrentes de acerto de contas entre grupos organizados fora da lei. E não descartaram policiais aproveitando esse momento se infiltrando e fazendo justiciamento por conta própria”,disse.
Para o advogado Ariel de Castro Alves, especialista em direitos humanos e segurança pública, a política de Ferreira Pinto está privilegiando a PM e tirando da Polícia Civil o poder de investigação. “Parece que a Polícia Civil está colocada de lado atualmente e a Polícia Militar que passou a fazer o trabalho de inteligência e de investigação. Será que o governo não confia na sua Polícia Civil?”, indagou o advogado.
O delegado-geral Marcos Lima discorda de quem diga que a Polícia Civil está sem poder de investigação. “A Polícia Civil e a Polícia Militar estão trocando informações de inteligência. Existe uma integração muito maior entre as duas polícias”.
O mesmo discurso do delegado-geral foi usado pelo coronel Marcos Chaves para defender o trabalho das duas polícias. “Temos informações da Polícia Civil também. Ela tem autorização para escutas e as passa para a PM”, disse o oficial, que, no entanto, admitiu que, em alguns casos, a Polícia Militar também tem autonomia para trabalhar com escutas telefônicas. “A PM trabalha na parte de planejamento, entre aspas, chamamos de ‘investigação’, para ver a situação criminosa num lugar específico."
O delegado-geral Marcos Lima discorda de quem diga que a Polícia Civil está sem poder de investigação. “A Polícia Civil e a Polícia Militar estão trocando informações de inteligência. Existe uma integração muito maior entre as duas polícias”.
O mesmo discurso do delegado-geral foi usado pelo coronel Marcos Chaves para defender o trabalho das duas polícias. “Temos informações da Polícia Civil também. Ela tem autorização para escutas e as passa para a PM”, disse o oficial, que, no entanto, admitiu que, em alguns casos, a Polícia Militar também tem autonomia para trabalhar com escutas telefônicas. “A PM trabalha na parte de planejamento, entre aspas, chamamos de ‘investigação’, para ver a situação criminosa num lugar específico."
O coronel ressalta a importância das escutas para a PM também. "Mas lembro que ela só é autorizada judicialmente. Eu sou favorável e não concordo com quem diga que a PM esteja sendo favorecida. Percebo que tenta se criar animosidade entre as duas polícias. Isso não é verdade.”
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